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Brasil enfrenta perda de mercado na África

By 16 de junio de 2014No Comments
Por Sergio Leo

Prioridade na política externa e comercial brasileira, a África está comprando menos do Brasil. As vendas para a África do Sul chegaram a cair um terço no primeiro quadrimestre, comparado ao mesmo período do ano passado.

Seis dos nove principais mercados africanos do Brasil compraram menos em 2013 que em 2011. A preocupação com o problema levou o Itamaraty e industriais da área de máquinas e equipamentos, que têm nos africanos bons clientes, a ensaiar uma nova estratégia de entrada no mercado do continente, capaz de fazer frente à arrasadora concorrência da China e de outros competidores.

Desde fevereiro, missões de empresários e governo iniciaram, em Angola, uma negociação que esperam estender a outros países africanos, para apoiar a industrialização local, com assessoria brasileira em questões como estudo de mercado, escolha de tecnologias, definição de estratégias de pessoal e fornecedores, e até o próprio desenho das fábricas. Em julho, nova missão, com apoio da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), volta a Luanda para discutir um projeto de construção ou reforma de três fábricas no país, e a criação de uma indústria para montagem local de equipamentos com componentes brasileiros.

‘Há muitas fábricas lá com produção bem abaixo de seu potencial, o que ameaça a viabilidade do negócio’, analisa o diretor-executivo de Mercado Externo da Abimaq, Curt Muller. ‘Podemos vender máquinas, mas também serviços, projetos, outros tipos de equipamento’.

Moçambique também foi alvo dessa primeira iniciativa, mas o país não se mostrou tão interessado quanto Angola que, na tentativa de reduzir a dependência das exportações de petróleo, tenta viabilizar sua Zona Econômica Especial, um setor industrial com incentivos oficiais e subsidiárias da poderosa petroleira estatal, a Sonangol.

O Brasil recebeu, neste ano, a visita da ministra angolana da Indústria, Bernarda Martins, do ministro de Energia e Águas, João Baptista Borges, e do presidente da Sonangol Investimentos Industriais, Eugênio Bravo da Rosa. Borges vem ao Brasil, em agosto, para avançar nas negociações.

A ida ao outro lado do Atlântico para montar fábricas na África é uma maneira de superar as dificuldades que abatem a competitividade do Brasil em exportações industriais. Empresários e governo têm a expectativa de que os brasileiros consigam mostrar um diferencial positivo em relação aos concorrentes, como a China, com esse modelo que não se limita a vender equipamentos, mas compartilha com os africanos a experiência brasileira de operações em mercados emergentes, complexos e bem distintos do ambiente previsível dos países desenvolvidos.

‘A coincidência da língua é mais um fator a facilitar a cooperação com os angolanos’, diz o diretor do Departamento Comercial do Itamaraty, Rodrigo de Azeredo Santos. ‘Não queremos entregar um projeto, isoladamente; vamos estudar a viabilidade dos negócios, as perspectivas da demanda’.

A ação na África tem apoio técnico de um instituto privado sem fins lucrativos, a Fundação Certi, de Santa Catarina, que já atuou em projetos industriais durante 2008 a 2010, na Libéria, Moçambique e Angola, com investimentos de US$ 500 mil em pré-projetos industriais que levaram a importações calculadas em cerca de US$ 100 milhões em máquinas e equipamentos do Brasil. O plano, agora, é mais ambicioso. ‘Em Angola, antes de construir fábricas, vamos definir uma estratégia, um estudo de viabilidade técnica, ambiental e econômica’, explica o gerente da Certi envolvido nas discussões, Thiago Mantovani.

O Brasil tem má experiência, com a Venezuela, em projetos de industrialização. Ensaiada em 2009, a cooperação para apoiar o esforço industrial do então presidente Hugo Chávez esbarrou na falta de interlocutores capacitados a administrar os projetos e na excessiva ambição do governo local, que anunciava a criação de 200 indústrias. O governo brasileiro deve se esforçar para evitar os erros do caso venezuelano. Há planos, no Itamaraty, de estender por toda a África um programa ‘Mais Energia’, baseado na experiência do ‘Luz Para Todos’ no Brasil, a exemplo do ‘Mais Alimentos’, que leva a países africanos projetos de apoio à agricultura familiar – e financiamento à compra de máquinas agrícolas do Brasil.

Prejudicadas pelos obstáculos do ‘custo Brasil’ e sob crítica intensa no Congresso, por legítimas preocupações com a corrupção endêmica nos negócios com o continente, a estratégia de expansão comercial e econômica do Brasil na África terá de se expandir mais agressivamente para além dos países de língua portuguesa, como notou o articulista do ‘Financial Times’, Joe Leahy, em seu blog ‘Beyond Brics’, na semana passada. Citando a consultoria Safmarine, o FT informou que o Brasil, por razões que incluem também barreiras protecionistas, ameaça perder mercados africanos no momento em que eles mais despertam a cobiça internacional, por seu desempenho econômico e sua classe média crescente.

A diplomacia tem se movido em relação aos africanos. Mas a discussão do tema no Brasil merecia maior profundidade e sofisticação, para além das disputas partidárias.

 

Sergio Leo é jornalista e especialista em relações internacionais pela UnB. É autor do livro ‘Ascensão e Queda do Império X’, lançado em 2014. Escreve às segundas-feiras

E-mail: [email protected]

 

 

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