Brasil pode retaliar no caso do algodão, dizem produtores
Por Sergio Lamucci | De Washington
Representantes dos produtores brasileiros de algodão estão numa maratona de reuniões em Washington com congressistas e autoridades americanas para discutir o imbróglio dos subsídios dos EUA ao produto. Nas conversas, os brasileiros têm indicado que o Brasil caminha para a retaliação, conforme as sanções autorizadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2009, no valor de US$ 830 milhões.
As retaliações só não entraram em vigor porque um acordo fechado em 2010 definiu que o governo americano pagaria US$ 147 milhões por ano para o Instituto Brasileiro do Algodão (IBA), em prestações mensais, até a aprovação de uma nova lei agrícola (Farm Bill) que respeitasse as regras da OMC.
Em setembro, porém, os americanos romperam o acordo, ao pagar pouco menos de 40% de US$ 12,3 milhões devidos, cessando depósitos a partir de outubro. Além disso, os EUA ainda não aprovaram a nova versão da Farm Bill, o que se espera que ocorra até o fim deste mês.
Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Gilson Pinesso afirmou que a retaliação não interessa aos brasileiros, mas ressaltou que quer o cumprimento do acordo. ‘Como a grande potência do mundo, uma das idealizadoras da OMC, tem tanta dificuldade para resolver o caso?’, disse Pinesso, num encontro no National Foreign Trade Council (NTFC).
A Abrapa reclama do rompimento unilateral do acerto, e do fato de que os valores pagos ao IBA, além de serem baixos em comparação com as perdas provocadas pelos subsídios, têm uso muito restrito, voltados para o financiamento de atividades de cooperação e assistência técnica para os produtores brasileiros.
Ao que tudo indica, a nova lei agrícola em discussão no Congresso não deverá satisfazer a Abrapa. Os textos em discussão substituem os pagamentos diretos e os anticíclicos por um programa de seguro complementar, chamado Stax (Stacked Income Protection Plan, em inglês). Segundo a avaliação da Abrapa, a nova legislação pode provocar ainda mais distorções do que a que vigorava na lei anterior, a depender dos preços do algodão.
O presidente do IBA, Haroldo Cunha, disse que, se as cotações caírem abaixo de US$ 0,60 por libra-peso, a nova versão causa mais distorções do que a anterior. Hoje, estão entre US$ 0,75 e US$ 0,80. Com o Stax, as estimativas são de que as perdas dos exportadores brasileiros de algodão ficarão entre US$ 100 milhões e US$ 600 milhões por ano, dependendo do nível dos preços internacionais.
Nesse cenário, o Brasil caminha para a retaliação. Em 18 de dezembro, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) definiu o recomeço do processo de consultas públicas, ao longo de janeiro, para retaliar os EUA em propriedade intelectual, como lembrou o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral, membro do conselho de diretores da Coalizão Brasileira da Indústria (BIC, na sigla em inglês), associação que defende interesses brasileiros em Washington. As medidas podem entrar em vigor no fim de fevereiro.
As retaliações poderão se tornar realidade num momento em que as relações entre Brasil e EUA não vão bem. As denúncias de que o governo americano espionou a presidente Dilma Rousseff a levaram a adiar a visita de Estado marcada para outubro de 2013.
Em reunião ontem com negociadores do Departamento de Agricultura e do Representante Comercial dos EUA (USTR, na sigla em inglês), os brasileiros ouviram um pedido de paciência, para esperarem a nova versão da Farm Bill. O texto tornaria mais flexível o uso dos recursos já pagos ao IBA, que somam cerca de US$ 500 milhões. Não houve, contudo, indicação de retomada dos pagamentos.