O novo governo de Dilma Rousseff começa com desafios nos planos internos e externos para colocar novamente o país no rumo do desenvolvimento. Se no plano interno, os problemas são amplamente discutidos, uma questão de extrema importância no plano externo tem recebido menor destaque, o Brasil irá reassumir a presidência pró-tempore do Mercosul. Será a primeira vez que o Brasil assumirá a Presidência no primeiro semestre de um ano e no início de um mandato presidencial.
Seguindo o rodízio entre os membros do bloco, em 2015, a presidência pró-tempore do Mercosul voltará a ser ocupada pelo Brasil e esse fato oferece grandes oportunidades para que, mais uma vez, se tente tirar o bloco da inércia e avançar em questões importantes para o Brasil no cenário internacional.
O Mercosul é muitas vezes criticado e citado como um fator que atrasa o desenvolvimento do país – principalmente por impossibilitar a assinatura de um maior número de acordos de livre comércio pelo Brasil[1] – mas o Mercosul é uma realidade e o governo Dilma não deu nenhum sinal até o momento de que pretende diminuir a importância dada ao bloco no âmbito da agenda de política externa, mantendo o bloco como uma de suas prioridades.
Além das questões políticas que ajudam a explicar a continuação e a insistência do governo brasileiro no bloco, existem também questões de comércio que são importantes nessa relação. A Argentina é hoje o 3º maior destino das exportações brasileiras, enquanto a Venezuela é o 7º, e Paraguai e Uruguai são tradicionais importadores de produtos brasileiros.
Os países do Mercosul não são apenas grandes importadores no valor total, são principalmente importadores de produtos industrializados brasileiros. São, portanto, mercados de suma importância para a indústria nacional, que por diversos motivos tem dificuldades para competir no mercado internacional.
Esse fator amplia a necessidade de discutir questões que podem causar desconfortos e atritos entre o Brasil e os seus parceiros como as restrições em relação ao comércio automotivo[2] e a aplicação das licenças não-automáticas no comércio com a Argentina, as dificuldades de pagamento na Venezuela para empresas brasileiras, o aumento da participação chinesa nas importações uruguaias e paraguaias, e a inclusão da Bolívia como membro do bloco.
Tão importante quanto as questões internas ao bloco, as questões externas também devem ser alvo da atenção do Brasil enquanto ocupante da presidência.
A 1ª questão que vem à lembrança quando falamos de Mercosul é o já famigerado acordo de livre comércio Mercosul – União Europeia que se arrasta por mais de uma década. Tendo apresentado sua proposta dentro das condições impostas pelos europeus, espera-se agora que o bloco sul-americano esteja de fato pronto para prosseguir com as negociações quando a U.E apresentar a contraproposta. Neste contexto, é importante que o Brasil não deixe que o contencioso iniciado pela U.E. no Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio – OMC afete de qualquer maneira o processo de negociação[3].
É importante entender também se e como o Brasil atuará para aumentar a proximidade do Mercosul com os demais membros dos “BRICS” – grupo das principais economias emergentes do mundo, quais sejam Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul -, outro bloco relevante para o país. Será especialmente interessante observar como o “Banco dos BRICS” ofertará ou não crédito para os países da região sul-americana; além de um possível aumento de comércio com Índia e África do Sul, com uma revisão do acordo com a Índia e entrada em vigor do acordo do Mercosul com a SACU -união aduaneira entre África do Sul, Botsuana, Lesoto, Namíbia e Suazilândia.
Ademais, outras questões que podem surgir no horizonte são um acordo com o Canadá, o qual anunciou recentemente a exclusão de 72 países do seu Sistema Geral de Preferências – SGP, dentre eles o Brasil, a Argentina, o Uruguai e a Venezuela, e uma aproximação com outros blocos, tais como a Aliança do Pacífico.
Em suma, no que pese a efetividade ou não do bloco econômico, o Brasil tem mais uma vez oportunidade de aumentar a importância do bloco para a economia brasileira e tirar as negociações comercias do Mercosul da inércia. Caso o Brasil tenha sucesso nessa empreitada, a forma como o Mercosul é visto internamente pode se alterar radicalmente.
[1] Os países do Mercosul não negociam acordos de livre comércio individualmente.
[2] O comércio automotivo é regulamentado por acordo bilateral entre as duas partes que deve ser renegociado durante o próximo ano.
[3] A U.E pediu oficialmente à OMC a abertura de um painel para investigar diversos programas brasileiros de incentivo a indústria como o INOVAR-AUTO e a Lei de Informática.