Por Assis Moreira | De Genebra
O racha na União Europeia (UE) em torno dos dois candidatos à direção geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), o brasileiro Roberto Azevedo e o mexicano Hermínio Blanco, vai causar uma iniciativa pouco comum, hoje em Bruxelas, a poucos dias da decisão na OMC. Os dois candidatos foram convidados discretamente pela UE a fazerem separadamente uma apresentação seguida de questões e respostas com os 27 países membros, no que se aproxima de uma sabatina.
Esse teste ocorrerá na véspera de reunião na qual o bloco comunitário espera decidir como votará na semana que vem na OMC. Nas duas primeiras rodadas de seleção na OMC, a UE colocou seus 28 votos (com o da Croácia, futuro membro) para Azevedo e Blanco. Agora é a escolha final, e só pode votar em dos dois. Para observadores da cena europeia, nesse cenário não haveria como Bruxelas escolher agora um ou outro, e sim deixar a decisão livre para cada país europeu votar como quiser.
Primeiro, tanto o Brasil como o México têm parceria estratégica com a União Europeia como um todo – o Brasil tem mais individualmente com países do bloco. Escolhendo um, a Europa corre o risco de ser acusada de distinguir entre parceria estratégica, considerando uma de primeira classe, e outra de segunda.
A ação dos britânicos e franceses contra Azevedo continua causando mau estar no governo brasileiro, também em razão da aliança estratégica com esses países, que implica compartilhar visões, objetivos e valores na governança global, por exemplo.
Autoridades brasileiras fizeram saber na Europa que, se um consenso for fechado em torno do candidato do México, o governo brasileiro saberá a quem atribuir essa decisão. Segundo um ministro brasileiro, em conversa com o Valor, uma eventual decisão da União Europeia de votar em bloco no candidato mexicano será interpretada em Brasília como resultado da ação das delegações inglesa e francesa.
Integrantes do governo Dilma Rousseff insinuam que haveria consequências negativas para as relações bilaterais, já que os defensores de Blanco teriam não só votado em seu candidato como trabalhado para sabotar a candidatura do brasileiro.
Para observadores, o convite da União Europeia mostra, em todo caso, que a sustentação de Blanco parece menos sólida do que parecia no bloco europeu, apesar dos esforços britânicos e franceses. Além disso, o campo de batalha na União Europeia é importante, mas não significa que seus 28 votos sejam determinantes entre 159 membros para decidir o novo diretor-geral da OMC, acreditam fontes.
Ontem, Roberto Azevedo recebeu apoio público na revista americana Foreign Policy, de David Rothkoph, ex-secretário adjunto de comércio dos Estados Unidos, que no passado negociou com Hermínio Blanco. Para ele, é tempo de a OMC ser dirigida por um país dos Brics (o grupo que reúne Brasil, China, India, Russia e Africa do Sul). E ele considera que o representante brasileiro é o melhor para a tarefa de tentar revigorar o sistema multilateral de comércio.
Preocupados com as notícias, em Brasília e Genebra, de danos à relação entre Brasil e Reino Unido devido à ação britânica na campanha pela Organização Mundial do Comércio, diplomatas britânicos, nos últimos dias, procuraram jornalistas brasileiros para assegurar que o governo da Grã-Bretanha está disposto a colaborar estreitamente com o futuro diretor-geral da OMC, qualquer que seja o resultado da eleição.
A discussão para sucessão na OMC é parte da ação diplomática normal e ‘não deve significar que relações estratégicas mais amplas estejam em risco’, afirmou ao Valor o conselheiro econômico da embaixada britânica em Brasília, Jonathan Dunn.
‘As visitas do primeiro-ministro [David Cameron] no ano passado e, mais recentemente, de nosso secretário de Estado para Negócios, Vince Cable, ilustram a importância da relação, para o Reino Unido’, afirmou Dunn. (Colaborou Sergio Leo, de Brasília)
