O artigo foi publicado na Revista Brasileira de Comércio Exterior (RBCE) do último trimestre (Julho a Setembro)
O apoio financeiro à exportação constitui ponto fundamental das políticas industriais nos países desenvolvidos e é sustentado por intermédio de fortes programas de governo. No Brasil, os programas oficias de apoio à exportação não são, em geral, vistos como instrumentos de política econômica capazes de contribuir para o fortalecimento da indústria nacional. A sensação é de que a razão para a existência dos programas oficiais não é tornada explícita e, por isso, são questionados. Verifica-se, também, falta de conhecimento das regras e do funcionamento dos programas.
O presente artigo pretende contribuir para o debate sobre o papel dos mecanismos dedicados a alavancar exportações brasileiras, bem como seu aperfeiçoamento. Busca, também, evidenciar o cenário de apoio à exportação no Brasil e apresentar as justificativas para que o apoio creditício à exportação e à internacionalização das empresas possa se constituir em pilar de sustentação da política econômica brasileira.
O FINANCIAMENTO À EXPORTAÇÃO NO MUNDO
É mundialmente consagrado o princípio de que a exportação e a internacionalização das empresas são fatores de grande relevância para o desenvolvimento econômico. Argumenta-se que são fonte autônoma de geração de emprego, renda e divisas para cada país, permitindo ganhos de escala e competitividade para as empresas.
Além disso, outros fatores vinculados ao apoio à exportação são regularmente mencionados, como os direcionados ao desenvolvimento de políticas industriais, equilíbrio do balanço de pagamentos, e desenho da política externa. Mais ainda, é senso comum indicar que esses instrumentos governamentais devem ser fortalecidos em momentos de fraco crescimento econômico.
O apoio oicial à inserção internacional das empresas, nos principais países desenvolvidos do mundo, é realizado por instituições comumente denominadas agências de crédito à exportação (ou Export Credit Agencies – ECAs), que têm como principal objetivo promover exportações que não seriam possíveis sem seu apoio, e fortalecer as empresas domésticas para competir internacionalmente.
As exportações apoiadas pelas ECAs representam menos de 3% do total do comércio internacional, justamente por terem atuação direcionada à um universo de bens de maior valor agregado, que necessita de longo prazo de financiamento e cobertura de riscos não disponíveis no mercado privado de crédito ou de garantias à exportação.
A principal premissa que dá sentido à alavancagem de exportações por instituições públicas é a atuação em nichos nos quais não exista o mercado privado. Ou seja, operações com longos prazos de amortização, financiamentos e garantia para exportações a países com baixa disponibilidade de crédito (como países da América Latina e África), apoio a pequenas e médias empresas, apoio a setores de produtos de alto conteúdo tecnológico e/ou forte competição mundial (como o aeronáutico), bem como transações de elevados valores que não poderiam ser financiados no mercado privado (como, por exemplo, os serviços de engenharia).
A institucionalização dessas agências de crédito à exportação é secular. A primeira foi criada, em 1906, na Suíça e, desde então, centenas de instituições com o mesmo objetivo foram criadas em vários países do mundo.
Vale ressaltar que, apesar de o apoio de programas oficiais estar focado na assunção de riscos, não significa que a atuação das ECAs, necessariamente, esteja vinculada à geração de perdas. Na verdade, atuam numa faixa de riscos não atendidos pelo mercado privado, mas administráveis por uma instituição pública, e buscam manter índices de solvência dentro de parâmetros estabelecidos nas legislações, com carteiras relativamente diversificadas.
A diferença é que os riscos são, normalmente, cobertos ou ressegurados pelos governos de seus países e, portanto, não têm de manter elevadas provisões de capital para as perdas contingentes de seus financiamentos. No Brasil, o Fundo de Garantia à Exportação (FGE) segue essa mesma linha, apresentando um reduzido índice de sinistralidade.
A experiência internacional demonstra que o apoio das ECAs é um poderoso instrumento de alavancagem das exportações e pode, por isso, provocar disputas entre países. Na prática, cada agência busca cobrar uma taxa cada vez menor para que as exportações de seus países tenham um melhor desempenho perante os concorrentes no mercado internacional¹.
Na década de 1970, a situação econômica internacional – de altas taxas de juros, déficits comerciais, elevação do preço do petróleo e recursos escassos dos governos – fez com que as agências dos países desenvolvidos tivessem uma atuação mais agressiva, com significativo aumento dos créditos concedidos. As disputas, somadas à situação financeira internacional, resultaram em um apoio oficial cada vez mais significativo e um gasto insustentável para os tesouros dos países.
Esse cenário deu origem ao Acordo sobre Normas de Conduta para Apoio Oficial em Créditos à Exportação (Arrangement on Guidelines for Oicial Supported Export Credits ), concebido na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na reunião do Banco Mundial/ Fundo Monetário Internacional (FMI) de 1973, e estabelecido em uma primeira versão a partir de 1976.
O objetivo do acordo é promover a “competição entre os exportadores dos países da OCDE, baseada em qualidade e preço dos bens e serviços, em vez de nas condições mais favoráveis de apoio oficial”. Norteia a atuação das ECAs com o estabelecimento de uma série de parâmetros relativos às condições dos financiamentos, seguros e garantias por elas concedidos.
Apesar de estabelecer parâmetros, o acordo não fragilizou os programas de apoio à exportação. Ao contrário, foram fortalecidos em alguns países com a crise 2008. A OCDE, por sua vez, tem se esforçado para manter sua função de coordenar as políticas de créditos dos vários países membros, com o objetivo de manter disciplinas financeiras, e não deixar que os subsídios à exportação criem distorções insustentáveis no comércio internacional.
O cenário de atuação das ECAs se tornou mais competitivo nos anos recentes, em razão da criação e atuação agressiva de agências de países em desenvolvimento, como China, Índia e Coreia. À competitividade industrial desses países se juntaram agências capitalizadas e com programas de mitigação de risco em outros países em desenvolvimento. Paradoxalmente, como se verá adiante, o Brasil tornou mais tímida sua estrutura de financiamento, em detrimento da competitividade de seus exportadores.
FINANCIAMENTO À EXPORTAÇÃO NO BRASIL
O financiamento à exportação no Brasil inicia-se, no final da década de 1960, como um dos instrumentos da política utilizados na estratégia de diversificação das exportações brasileiras. Com essa diretriz, foi criado o Fundo de Financiamento à Exportação (Finex), cuja gestão ficou a cargo da Carteira de Comércio Exterior (Cacex) do Banco do Brasil, que já tinha, entre outras atribuições, a emissão de licenças de importação e o estabelecimento de sobretaxas de câmbio.
Com a crise brasileira da década de 1980, caracterizada pela retração agressiva da produção industrial, inflação, alta das taxas internacionais de juros que causaram um crescimento da dívida do Brasil, além do aumento do déficit público e da dívida interna por causa da política fiscal expansionista, as linhas de créditos às exportações foram interrompidas.
Somente ao longo dos anos 1990 que o governo brasileiro volta a demonstrar preocupações com a política de comércio exterior. Foi reorganizada sua estrutura, reformulando-se também o sistema brasileiro de seguro e de financiamento às exportações: houve a desativação da Cacex (1953-1990), a extinção do Finex (1966-1990) e a criação do Programa de Financiamento à Exportação (Proex,1991) e do FGE (1998). Durante o ano de 1990, também o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) inicia suas operações na área de comércio exterior.
A justificativa para todas essas medidas era o entendimento da importância das exportações para o crescimento do país e da grande competição no comércio internacional, bem como da relevância do instrumento de financiamento às exportações na política de comércio exterior. Por fim, foram criados órgãos colegiados com a competência de gerir a utilização dos recursos da União destinados ao Proex e ao FGE, que a partir de 2003 foram substituídos pelo Comitê de Financiamento e Garantia da Exportação (Coig).
Seguindo a linha de estruturar uma política para o setor exportador, em 1995 foi criada a Câmara de Comércio Exterior (Camex), que tem a competência de formular, implementar e coordenar as atividades relativas às exportações e importações de bens e serviços brasileiros, que estão dispersas em diversos órgãos do governo. O papel institucional do Conselho de Ministros que compõe a Camex é fazer a articulação entre esses órgãos, com o objetivo de otimizar os resultados das empresas brasileiras no comércio internacional.
Essa estrutura, criada nos anos 1990, é a que existe ainda hoje. A principal fonte de financiamento de longo prazo para as exportações brasileiras é o BNDES, com desembolsos anuais entre US$ 4 e 6 bilhões. Os setores apoiados são exportadores de bens de capital e de serviços de engenharia para países da América Latina e África, com a exportação de serviços respondendo anualmente por cerca de 80% do total desembolsado.
O risco é um dos principais fatores impeditivos da realização de operações internacionais e questão central na negociação das vendas externas, já que raramente é assumido por instituições privadas. Desse modo, o FGE tornou-se essencial para viabilizar as operações de longo prazo e de elevados valores, cumprindo o mesmo papel das agências de crédito à exportação dos países desenvolvidos.
Por sua vez, o financiamento com recursos do Proex está voltado para o suporte das exportações de micro, pequenas e médio empresas (MPMEs) e créditos concessionais, sendo estes últimos, destinados a países com sistemas financeiros limitados, que não participam dos mercados internacionais, no que se refere à captação de recursos, em razão de suas dificuldades econômicas e sociais.
O Proex, na modalidade de Equalização de Taxas de Juros, tem vocação para atender empresas de maior porte, que conseguem outorgar a reciprocidade necessária aos bancos privados financiadores das suas exportações.
A partir do rearranjo dos programas oficiais de crédito à exportação e da criação de modelos, como os acima mencionados, o Brasil saiu de um patamar de exportação de US$ 31 bilhões, em 1990, para atingir o recorde de US$ 256 bilhões, em 2011. A partir desse ano, no entanto, o desempenho das exportações brasileiras vem caindo na média de 1,7% ao ano, sendo que, no acumulado de janeiro a julho de 2015, o valor exportado de aproximadamente US$ 113 bilhões é 15,5% menor do que o do mesmo período do ano passado.
Contribui para essa performance negativa da exportação brasileira a perda de competitividade das empresas. O crescimento lento da produtividade, a falta de estrutura logística, mudanças cambiais desfavoráveis, aumento dos custos com energia, além dos custos tributários, previdenciários, trabalhistas e burocráticos, estão entre os fatores da elevação do custo produtivo do país.
A recente valorização do real, apesar do efeito positivo sobre as receitas com vendas ao exterior, não resultou em um impacto expressivo no crescimento das exportações. A razão disso é simplesmente porque o aumento na quantidade exportada de bens e serviços demanda tempo, devido às dificuldades inerentes à entrada em novos mercados. Além disso, pelas razões citadas, os produtos industriais brasileiros não são competitivos, cenário que não deve mudar no curto prazo.
Seguramente, o aperfeiçoamento na utilização dos programas de crédito à exportação contribuiria para a reversão do quadro atual da exportação brasileira, e consequentemente para o crescimento da economia. Existem críticas, algumas vezes contundentes, sobre o papel dos programas brasileiros, na própria definição de seu objetivo essencial e na sua eficácia. Mas, na verdade, a existência de instrumentos sólidos de apoio às exportações é determinante, em vários segmentos econômicos, para o sucesso das empresas no exterior, como o de bens de capital, serviços e aeronáutico.
Pode-se dizer, entretanto, que a atuação brasileira não acompanha a agressividade de outras Agências de Crédito à Exportação (ACEs) no mundo. Todos os países industrializados continuam mantendo programas de apoio público às exportações e é crescente a participação de novas agências em países emergentes. Comparativamente, embora os programas brasileiros sejam bem estruturados, um novo direcionamento na sua gestão e operacionalização poderia resultar nos ajustes demandados pelo setor exportador brasileiro.
Alguns acontecimentos registrados nos últimos anos trouxeram como consequência a falta de credibilidade dos programas brasileiros. Houve aumento de burocracia, frequentes contingenciamentos dos recursos orçados, atrasos na execução orçamentária (impactando exportadores e bancos privados), frequentes modificações de procedimentos e diferentes interpretações de regras vigentes. As medidas tomadas pelo governo, em 2015, tornaram ainda mais crítica a questão da confiança e dificultaram o desempenho exportador das empresas que historicamente utilizam os programas oficiais na estruturação de suas operações.
Não é necessário muita reflexão para concluir que uma política de comércio exterior precisa de definição, critérios e recursos previsíveis, além de conceder a devida importância ao desenvolvimento da infraestrutura interna do país. Para permitir a efetiva execução de política externa e de comércio exterior, que tem como objetivo elevar a presença de empresas brasileiras no exterior e aumentar a exportação, é necessária a contrapartida de apoio financeiro, como acontece nos países desenvolvidos.
No caso do Brasil, o sistema vigente de seguro de crédito à exportação, ao amparo do FGE, é com certeza o principal instrumento de política de comércio exterior para apoiar a entrada das empresas brasileiras nos mercados internacionais. Assim, a cobertura de crédito à exportação de longo prazo destinado a países de risco elevado só se viabiliza com a presença dos governos e é a principal área de atuação das ECAs no mundo.
No entanto, o sistema brasileiro caracteriza-se pela gestão restritiva, ou seja, não demonstra autonomia para a assunção de riscos usualmente aceitos por concorrentes internacionais. Além disso, tem sido utilizado apenas pelas grandes empresas, e a garantia para suas exportações é a principal demanda das MPMEs.
Embora, segundo o discurso oficial, o financiamento do Proex tenha foco no apoio nas MPME, as garantias admitidas para as operações, normalmente de instituições privadas, não são de fácil acesso aos exportadores de menor porte. Com relação ao BNDES, que é a única fonte de recursos de longo prazo para as exportações, por conta de suas características de banco público, tem se mostrado um instrumento sofisticado, com acesso restrito a poucas grandes empresas.
A conclusão necessária é que o governo brasileiro precisa de programas mais substantivos para dar competitividade à exportação brasileira. Como exemplo, poderia ser citada a modalidade de garantia para emissão de títulos por empresa privada, para facilitar a colocação de papéis no mercado de capitais. No caso, os recursos captados seriam destinados exclusivamente para financiar o importador estrangeiro. O FGE representa aval da União, e portanto vai viabilizar o investimento privado de pessoas físicas e jurídicas nacionais e estrangeiras, o que vem ao encontro da necessidade do governo em buscar capital privado.
Nesse contexto, outra questão relevante é que, no governo brasileiro, a definição da política de comércio exterior está distribuída por diversos órgãos da administração direta e indireta, e a competência sobre os principais instrumentos de apoio financeiro, bem como o controle das exportações e importações, estão na esfera do Ministério da Fazenda.
A necessidade de coordenação entre os órgãos é, aliás, o principal motivo para a existência da Camex, que tem como papel institucional o assessoramento imediato da Presidência da República, responsável pelas diretrizes da ação governamental na área de comércio exterior. Desse modo, a atuação da Camex mostra-se indispensável para que o exame e a deliberação sobre aspectos comerciais, iscais e políticos das exportações brasileiras sejam realizados de forma colegiada e harmônica.
Mesmo em ano de restrição fiscal, o financiamento à exportação é importante para compensar o baixo crescimento do país e melhorar a balança de pagamentos. No cenário atual, tendo em vista as competências da Camex e sua importância no contexto da estrutura organizacional e a interface no poder executivo, frente às demandas e urgências das diretrizes de comércio exterior, constata-se que se faz necessário o fortalecimento do Conselho, com o cumprimento das competências previstas na sua legislação.
Infelizmente, nos últimos anos, a Camex foi se afastando do seu papel central e medidas ligadas ao comércio exterior foram decididas em outras esferas do governo, em detrimento, algumas vezes, da busca pelos resultados positivos para a competitividade internacional dos exportadores brasileiros.
FINANCIAMENTO E POLÍTICA ECONÔMICA
Ponto crucial na gestão de programas oficiais é a comprovação da eficácia dos programas que são operacionalizados com recursos da União. Com o intuito de contribuir com essa discussão, alguns exemplos podem ser elencados para demonstrar a importância dos programas voltados a alavancar as exportações.
No caso das operações de bens de capital, o acordo comercial entre exportador e comprador no exterior, necessariamente, inclui um pacote de financiamento negociado simultaneamente, dado que o ciclo produtivo é longo. Assim, a não inclusão das condições de pagamento dos bens representa uma perda de competitividade para o exportador brasileiro.
Os prazos requeridos para essas operações tornam o custo financeiro dos créditos ofertados por bancos privados acima do nível de competitividade possível. Por essa razão, os principais exportadores de manufaturados, que estão entre os 200 maiores de acordo com dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), assim como as empresas dos setores de máquinas e equipamentos de alto valor agregado e aeronáutico, têm recebido apoio do programa Proex Equalização, que reduz o custo final da operação.
As maiores empresas exportadoras brasileiras de manufaturados são grandes grupos internacionais, que utilizam, normalmente, como estrutura de crédito nas suas exportações o financiamento para uma empresa do mesmo grupo. Nestes casos, a empresa financiada, que aparece como importador, repassa os financiamentos ao comprador final, assumindo o risco de crédito da operação. O objetivo dessa estrutura é mitigar riscos, dado que as exportações muitas vezes ocorrem para mais de 40 mercados diferentes. Além disso, seria inviável para o exportador brasileiro estruturar financiamento para cada um dos importadores finais.
Esses grupos multinacionais fizeram grandes investimentos no Brasil, e as plantas industriais instaladas no país competem com outras plantas localizadas em vários países, alguns com forte apoio oficial à exportação e outros com baixo custo de produção. A decisão das matrizes de manter ou aumentar a produção destinada à exportação a partir do Brasil depende diretamente das condições oferecidas pelo país, que, atualmente, não representa um low cost country para essas empresas, tendo em vista que a competitividade brasileira é afetada por vários fatores internos.
Para as indústrias de bens de capital instaladas no Brasil, a exportação é essencial para o desenvolvimento de novas tecnologias e investimento em inovação, considerando que produtos sofisticados, com tecnologia de ponta, são mais demandados pelos importadores dos países desenvolvidos. Empresas brasileiras compram máquinas e equipamentos com menor valor agregado. Se dependesse do mercado interno, além de fabricar bens menos desenvolvidos tecnologicamente e, portanto, com menor valor agregado, as empresas instaladas no país teriam de enfrentar, atualmente, um mercado com desaceleração da demanda.
O apoio oficial à exportação brasileira acarretou renovados investimentos no país e transferências de linhas de produção, com avanço na tecnologia, para venda a partir do Brasil, nos últimos vinte anos. As principais motivações para uma empresa realizar investimentos diretos em outro país é a busca de novos mercados, de recursos de produção mais baratos do que no país de origem e de condições competitivas para suas exportações. Essas empresas têm acesso a funding de bancos internacionais, que, combinado com o Proex Equalização, viabiliza, sem risco financeiro coberto por programas oficiais brasileiros, a exportação brasileira a um custo competitivo, equivalente aos praticados pelas agências de crédito à exportação dos países desenvolvidos.
Outro segmento que depende de apoio oficial – a exportação de serviços – recebe efetivo apoio de agências de crédito à exportação em todos os países desenvolvidos, porque demanda longos prazos de repagamento para créditos de alto valor e, consequentemente, está vinculada a riscos de crédito não assumidos pelas seguradoras privadas.
A intensificação da atuação do BNDES-Exim e a instituição do FGE e do Proex Equalização, a partir do fim da década de 1990, proporcionaram o incremento da participação brasileira nos principais mercados de projeção geopolítica do Brasil, América Latina e África, principalmente no que se refere à exportação de serviços.
Esses dois mercados, no período desde 2004 a 2012, apresentaram os maiores índices de crescimento – América Latina 18,2% e África 16,6%, superando até a Ásia – e foi também nesses mercados onde cresceu a demanda por itens necessários à ampliação da capacidade produtiva industrial e de infraestrutura. São justamente os países onde surgem oportunidades de exportação de serviços e bens de capital e onde as empresas brasileiras são mais competitivas. No entanto, são também os de maior risco percebido pelos agentes financeiros privados, e por isso o apoio de programas oficiais se torna essencial para viabilizar a atuação das empresas brasileiras. Entre os anos de 2003 e 2013, conforme estudo divulgado pela LCA Consultores, as exportações brasileiras de serviços de engenharia, foram incrementadas em 3,5 vezes. Esse crescimento permitiu que o Brasil se posicionasse como vice-líder de mercado na América Latina, com market share de 17,8%, atrás da Espanha, que detém 29,6% do mercado. No caso do mercado africano, o Brasil ocupa a sexta posição entre os maiores exportadores, com uma participação ainda pequena de 4,1%, atrás da China (44,8%), Itália (13%), França (8,9%), Coreia do Sul (4,8) e Estados Unidos (4,7%).
A presença brasileira nesses mercados foi relevante na exportação de serviços de engenharia, representando 94% do total das exportações brasileiras (75% no caso latino-americano e 19% no caso africano). Esse incremento, nos últimos anos, é oriundo tanto da competitividade das empresas brasileiras quanto das políticas públicas de apoio às exportações de bens e serviços, cujos programas têm sido continuamente utilizados pelas exportadoras de serviço de engenharia, viabilizando o aumento da presença brasileira no mercado internacional.
Quando os programas oficiais de crédito à exportação são utilizados nos financiamentos a governos de outros países, para obras de infraestrutura de grande impacto social, fica evidenciado seu papel como instrumentos complementares do governo brasileiro na execução de sua política externa e nas relações bilaterais com diversos países.
CONCLUSÃO
O Brasil passa, nesse momento, por uma grave crise econômica e financeira. Os instrumentos governamentais para alavancar as exportações deveriam ser fortalecidos e considerados como mecanismos de investimento, geração de emprego e renda.
O apoio oficial à exportação constitui instrumento de política econômica utilizado em todo o mundo como forma de fomentar o crescimento, via ganhos de produtividade resultantes da especialização, de escala, de concorrência e inovação, da geração de empregos.
Desse modo, propostas e demandas do setor exportador brasileiro devem ser consideradas pelo governo com o objetivo de garantir que as diretrizes da política de comércio exterior e de internacionalização das empresas brasileiras sejam executadas de forma satisfatória, levando a exportação brasileira a mercados competitivos e com grande potencial para a indústria nacional. Em sentido contrário, o avanço das exportações brasileiras nos mercados da América Latina e África está sendo restringido pela limitada capacidade desses países de oferecer garantias. Competidores globais, notadamente a China, articulam políticas mais agressivas, e ampliam suas vendas em detrimento do Brasil.
O FGE tem espaço para aumentar sua atuação, mantendo as regras de solvência previstas na legislação pertinente, bem como permitindo que o Fundo cumpra efetivamente seu papel de atuar nas lacunas do mercado, como as demais agências do mundo.
Dentro da agenda do governo para o crescimento do país, deve estar a recuperação do dinamismo da indústria e, em consequência, das exportações de produtos manufaturados, de maior valor agregado e de maior conteúdo tecnológico. O principal programa governamental de apoio para o setor de manufaturados tem sido o Proex Equalização, cujas operações são estruturadas com financiamento de bancos privados internacionais, sem risco de crédito para o governo brasileiro e fazendo as exportações brasileiras atingirem quase duzentos países.
Outro segmento que merece atenção na definição de políticas de comércio exterior é o de micro e pequenas empresas. Todos sabem da capacidade que as empresas de menor porte têm para gerar empregos e melhorar a distribuição de renda. Representam 98% do total das empresas instaladas no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e respondem por 60% dos empregos gerados e por 43% da renda total dos setores industrial, comercial e de serviços.
Esse segmento tem enorme dificuldade de acesso às instituições financeiras privadas, por isso dependem diretamente do apoio de programas oficiais para que possam alavancar exportações. As principais razões para isso são o elevado risco do segmento, o custo administrativo muito elevado e o fato de que, normalmente, exportam para pequenas empresas no exterior.
O apoio oficial brasileiro dedicado a esse segmento é feito basicamente pelo Proex Financiamento, que tem atendido uma média de 400 empresas por ano. É uma atuação ainda tímida diante do grande universo de MPME. Em geral, o maior acesso ao programa esbarra sempre na questão da garantia. Neste sentido, o FGE é a ferramenta que precisa ser ajustada para melhor amparar as operações das empresas de menor porte.
Restrições de orçamento e acesso aos programas de apoio à exportação não podem ser feitas para acomodação de necessidades circunstanciais da política fiscal, sob o risco de comprometer, irremediavelmente, anos de inserção internacional de diversas empresas exportadoras. Ao contrário, deve haver uma sintonia para ajustar esses programas, de maneira a preservar os níveis de participação do Brasil no mercado mundial.
Argumente-se, ainda, que os benefícios dos programas de apoio à exportação vão muito além dos valores registrados nas planilhas orçamentárias. Trata-se de investimento que dimensiona a própria presença do Brasil nas cadeias globais de valor.
Entre os órgãos envolvidos, seguramente o MDIC pode fazer um excelente trabalho de aumento da base com a divulgação dos programas, melhoria do acesso de exportadores e participação dos bancos privados. O Tesouro Nacional, por sua vez, deve garantir a previsibilidade e um orçamento adequado. Deve-se recordar que, com a disputa agressiva por mercados, cresce a responsabilidade dos órgãos gestores dos programas oficiais de apoio à exportação para manter e elevar a inserção internacional da economia brasileira.
O reconhecimento da necessidade de um novo modelo de apoio mais amplo vai aumentar a capacidade de o Brasil exercer uma política de comércio exterior, com todos os resultados reconhecidamente positivos advindo do crescimento das exportações.
Não se pode, evidentemente, deixar de reconhecer que escândalos recentes afetarão a compreensão pública sobre a relevância dos programas oficiais de financiamento. Obviamente, distorções devem ser investigadas, com a punição de eventuais irregularidades. Entretanto, o desconhecimento dos mecanismos pode levar a decisões precipitadas ou à imobilidade decisória, engendrando imprevisibilidade para os agentes privados e incapacidade de concluir novos projetos que teriam impacto relevante para as exportações brasileiras. Um desafio, nos próximos tempos, será defender os programas oficiais de financiamento à exportação, defender seu aperfeiçoamento e sua expansão. Incumbem-se deste desafio não apenas os órgãos diretamente envolvidos (destacando-se a Camex), mas também os operadores privados que se beneficiam diretamente da possibilidade de concorrer, em condições de igualdade, no competitivo mercado global.