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Perspectiva de adiamento da ação do TSE, falta de consenso sobre um novo nome, dados levemente positivos da economia e a sensação que o pior já passou. Após a eclosão da pior crise política de seu governo com a delação da JBS e que praticamente havia liquidado a atual gestão, Michel Temer ganhou fôlego nos últimos dias. Com essa leve mudança de perspectiva, o presidente mandou diversos recados entre o nal desta semana e o começo desta: está disposto a resistir o quanto puder no cargo e quer retomar a pauta de aprovação das reformas econômicas, vistas como cruciais para interromper a trajetória de alta da dívida e fortalecer a sustentabilidade do crescimento econômico.

Porém, apesar de Temer querer retomar a agenda que praticamente parou após o dia 17 de maio, quando a delação da JBS explodiu, nada será como antes. As perspectivas sobre o que passará das reformas, principalmente a previdenciária, diminuíram consideravelmente após a eclosão da crise. Assim, nesta semana, jornais apontaram que a base aliada do governo estaria articulando uma reforma da previdência branda. O jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, destacou nas conversas que os parlamentares já discutem aprovar apenas o aumento da idade mínima para a aposentadoria , considerado um dos pilares da proposta.

As outras mudanças seriam encaminhadas só a partir de 2019, quando o País terá um novo presidente eleito pelo voto direto. Essa sinalização, inclusive, foi conꐁrmada pelo líder do DEM (um dos partidos da base aliada) na Câmara dos Deputados, Efraim Filho, durante essa semana. “Não se tem expectativa alguma de que se tenha os votos para aprovar a reforma. Você só tem condições de apontar um norte para essa discussão após a consolidação da situação do país: se a decisão do TSE é favorável ou adversa (ao presidente Michel Temer), se dá ao governo condições de continuar, se haverá novo cenário”, afirmou. Apesar das falas do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), de que há “zero” chance de fatiamento, este é o cenário que vem se desenhando atualmente.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ex-diretor do Banco Central  Alexandre Schwartsman, ainda apontou que, enquanto não se souber se o presidente Temer fica ou não no Planalto, o ambiente de incerteza vai afetar os negócios. Porém, no caso de Temer prosseguir com o mandato, ele usará o seu capital político (diminuto) para se segurar no cargo. Assim, a agenda de reformas ficaria em segundo plano. “As reformas ficam ameaçadas e com elas as perspectivas de recuperação.” Por isso, aponta ele, para a economia, a troca de presidentes seria positiva.

Dessa forma, o cenário que se desenha pode ser o pior possível no curto prazo para as reformas. Com Temer cambaleando e com a situação ainda indeꐁnida em caso de postergação da ação no TSE, analistas de mercado e economistas apontam que muito pouco da reforma deve passar, ao mesmo tempo que o presidente segue na corda-bamba em meio ao recorrente noticiário contra ele no âmbito da Operação Lava Jato. Já um novo presidente, desde que fosse pró-reformas e sem imbróglios jurídicos, poderia dar mais legitimidade à agenda que o peemedebista iniciou um ano atrás.

 

Resiliência

Dentre os analistas que veem um ambiente um pouco mais complicado, está a LCA Consultores, que também avalia que o quadro político parece ter ficado ainda mais indefinido nos últimos dias em meio à resistência de Temer.

Porém, aponta, esses desenvolvimentos recentes não parecem suficientes para sinalizar chance preponderante de que Temer seguirá na presidência até o final de 2018. “Sua fragilização política nos parece irreversível; e pode vir a se acentuar ainda mais com eventuais novas evidências oriundas de delações que ainda não foram tornadas públicas (ou nem mesmo feitas). A eleição indireta para escolher o sucessor de Temer até as eleições diretas programadas para o final de 2018 ainda nos parece o desfecho mais provável da onda de turbulência política”, ressaltam os analistas. Contudo, o timing do desfecho, que antes a LCA apontava como até o final de junho, tornou-se mais incerto.

Assim, mesmo com Temer resistindo, o cenário mais provável para a LCA é de que ele acabe caindo e eleições indiretas sejam convocadas. Com esse cenário no radar, a LCA ressalta ser claramente preponderante a possibilidade de que as diretrizes gerais da atual política econômica (e até mesmo a presente equipe econômica) sejam preservadas. “Nos patamares atuais, o risco-Brasil e o câmbio parecem alinhados a essa possibilidade, e não sofreriam ajustes adicionais relevantes, mesmo que a votação da reforma da Previdência não venha a ser retomada antes de 2019 (ou que ela seja aprovada antes disso, mas em versão mais “desidratada” do que a atual)”. Esse seria o motivo que explica a relativa tranquilidade dos mercados em relação à tanta turbulência política: o mercado já precificou em certa medida as dificuldades para a aprovação da Previdência agora, mas segue apostando que ela vai ocorrer nos próximos anos.

Já na hipótese de Temer conseguir se manter na cadeira presidencial, a possibilidade de preservação das diretrizes econômicas não é tão clara, diz a LCA. Isso porque, uma vez que as ações que Temer vem tomando e poderá vir a tomar para se assegurar no cargo poderia gerar atritos com a equipe econômica e provocar deserções na base de apoio. “Até por isso julgamos que sua sobrevida na Presidência não deverá se estender até o fim de seu mandato. Nesse caso, os mercados de risco e câmbio tenderiam a ficar mais voláteis; mesmo porque, nessa situação, a chance de eleições diretas antecipadas, com desfecho incerto, tenderia a aumentar”. Assim, para eles, o cenário base antevê uma evolução do quadro político que não favorecerá uma rápida retomada das reformas fiscais,sobretudo da Previdenciária, mas que tampouco provocará um retrocesso nas reformas já implementadas (como a do teto de gastos públicos) ou instigará uma guinada nas diretrizes gerais de política econômica até as eleições de 2018.

“Nessas circunstâncias, avaliamos que o risco-Brasil e a cotação do dólar no Brasil, conquanto devam seguir sujeitos a períodos de volatilidade, não deverão sofrer altas adicionais significativas”, afirma a LCA. A mesma visão é compartilhada pelo economista-chefe do Deutsche Bank, Jose Carlos Faria, em relatório publicado esta semana. Ele destaca que a reforma da Previdência é condição necessária, mas não suficiente para estabilizar a dívida pública brasileira, uma vez que o governo terá que retomar o crescimento, elevar impostos e cortar mais despesas de modo a produzir um superávit primário até 2020.

Neste sentido, a minirreforma (caso ocorra) adiará ainda mais a consolidação e medidas adicionais serão ainda mais necessárias para a estabilização das contas. Dito isto, o economista aponta que, dada a confortável situação da balança de pagamentos e repetidas boas notícias sobre inflação, os investidores parecem acreditar que os rendimentos dos títulos soberanos nacionais estão altos o suficiente para cobrir o riscos.

Por enquanto, avalia Faria, os mercados parecem dispostos a dar ao Brasil o benefício da dúvida e, portanto, mais tempo para implementar seu ajuste fiscal . “Consequentemente, assumindo a continuação de um ambiente internacional benigno (especialmente taxas de juros baixas nos EUA) e a ausência de choques domésticos adicionais, o Brasil pode ser capaz de retirá-lo e manter a estabilidade econômica apenas com reformas muito superficiais antes das eleições de 2018”, conclui.

 

O risco de uma nova Dilma?

O diretor de Relações Governamentais da Barral M. Jorge, Juliano Griebeler, aponta que Temer, que criticou Dilma Rousseff por ser um vice-decorativo, perdeu sua base de sustentação e corre o risco de se tornar um presidente com pouca participação na política econômica do país.

“O Congresso Nacional tem funcionado não graças a Temer, mas apesar dele. Temer não sairá facilmente da presidência, a sua renúncia comprometeria não apenas a sua imagem, mas a de seus aliados que também contam com os privilégios de seus cargos para não serem investigados pela justiça comum”.

Neste sentido, ressalta ele, o PSDB tem articulado um nome de consenso para substituir o atual presidente. Porém, há bastante cautela, que se dá por diversos fatores. Dentre eles, destaca-se a necessidade de manter um bom relacionamento com PMDB, além do fato da legenda estar diretamente envolvido nas acusações. Assim, qualquer crítica direcionada ao presidente pode no futuro ser usada contra eles.

Em meio a perda do poder de fogo, mas expectativa de que lutará pela presidência até o final, Temer poderá se transformar em uma espécie de “Dilma Rousseff”? Para Griebeler, a resposta é não: o cenário com Temer seria bem diferente do registrado com Dilma no final de seu governo.

“A personalidade dos dois presidentes é bem diferente, Temer não teria a rejeição que Dilma teve por parte do Congresso, apesar de ter sua capacidade de influência e participação direta afetadas”, afirma.

 

O novo fator de risco para Temer

Conforme destacado acima, a semana caminhava para ser de resistência e aumento de forças de Temer no poder. Até mesmo o ex-presidente Lula apontou que o peemedebista conseguiu ganhar sobrevida. Porém, como tudo que acontece nos últimos anos no Brasil, uma nova virada pode estar prestes a acontecer. Em meio à proximidade do julgamento no TSE, um fato novo pode levar à perda de apoio político e “contaminar” a decisão do Tribunal Eleitoral sobre a ação da chapa Dilma-Temer.

Trata-se da possível prisão do ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, que perdeu o foro privilegiado após o ex-ministro da Justiça Osmar Serraglio (PMDB-PR) recusar o ministério da Transparência e voltar para a Câmara dos Deputados (Loures é suplente). Assim, o procurador da República Rodrigo Janot pediu novamente a prisão de Loures e o Planalto já vislumbra uma possível delação e o impacto no TSE e na base aliada, que estaria à espera de um “fato novo” para iniciar mais um movimento de pressão sobre Temer.

Conforme aponta Juliano Griebeler, o fato de Rocha Loures ter perdido o foro privilegiado deve acelerar as investigações contra o deputado e a negociação de uma delação, uma vez que a prisão do político é muito provável. Porém, dificilmente Loures delatará o presidente, acredita. De qualquer forma, Griebeler destaca que qualquer fato novo dá espaço para que instabilidades afetem novamente o Palácio do Planalto e mudanças sejam feitas nos ministérios.

“Entretanto, vale destacar que uma delação premiada demora meses para ser a manutenção de Temer, continua sendo, o apoio do PSDB. E o apoio está condicionado ao andamento das investigações e revelações a serem apresentadas contra o presidente”, afirma.

O presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati, disse que na semana que vem, independente do resultado do julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE , o partido vai se reunir e tomar uma decisão definitiva sobre se vai se manter ou não base. Mas, de qualquer forma, o Planalto já contabiliza uma debandada parcial dos tucanos na próxima semana. Nesse cenário, o discurso preventivo no Planalto é de que o importante é que os tucanos mantenham o apoio às reformas, mesmo que haja este desembarque.

Desta forma, nada está definido, o que tornam as próximas três ou quatro semanas cruciais para a permanência de Temer no poder, aponta a consultoria de risco político Eurasia e o ambiente para aprovação de reformas segue complicado. O presidente vem apostando em sinais, ainda que brandos, da economia para tentar estabilizar a política, mas isso ainda parece muito pouco perto do que pode estar por vir. Enquanto isso, Temer segue no Planalto, mas até quando e de que maneira ainda seguem como incógnitas, ao mesmo tempo que o mercado segue na expectativa de que, independentemente do desfecho desse novo capítulo da crise, as reformas são inevitáveis.

Com isso, a situação até agora é de relativa tranquilidade nos mercados, em meio à crise política. Porém, paradoxalmente, conforme apontou o diretor da Eurasia Christopher Garman, essa reação pode representar mais um obstáculo às reformas. “Se o mercado não reage, é difícil conscientizar parlamentares da necessidade da reforma”, disse Garman em evento nesta semana; contudo, ele seguiu ponderando que a expectativa é de que a agenda continue com Temer ou sem Temer.

Em entrevista à Bloomberg, Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, destacou que o otimismo do mercado passa uma mensagem perigosa de que está tudo bem. “Talvez reformas passem, mas, neste momento, não dá para ter tanta certeza de que isso vai acontecer”, afirmou. Além disso, para quem espera que a reforma de verdade virá a partir de 2019, com um novo presidente eleito, o cenário que se reserva desponta para ainda mais incertezas.

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