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Conversamos com Welber Barral, ex-secretário do Comércio Exterior

Welber Barral é uma das maiores autoridades brasileiras quando o tema é comércio internacional. Em seu currículo, consta a posição de secretário nacional de Comércio Exterior, ocupada entre 2007 e 2011 — um dos períodos mais prósperos do País na área.

Especialista em defesa comercial e negociações internacionais, tem mais de vinte anos de experiência como consultor para agências governamentais e empresas na América Latina. Além disso, foi árbitro no Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul e na Organização Mundial do Comércio (OMC) e professor visitante em diversas universidades no Brasil e no exterior.

Em um momento de instabilidades para os exportadores, com ameaças globais de medidas protecionistas e o elevado preço de se produzir no Brasil, Barral nos recebeu para uma entrevista em São Paulo, na sede da Câmara de Comércio Americana (Amcham) — onde atua como conselheiro.

Entre os temas abordados, estão a briga entre norte-americanos e chineses, as eventuais consequências dela para o alumínio brasileiro e o Risco Brasil. “Poderíamos ser uma grande plataforma exportadora, gerando muitos empregos a partir do comércio exterior. Isso não é realidade por problemas que nós mesmos criamos”, lamentou, defendendo que as exportações podem alavancar a economia nacional. Confira a entrevista!

Nos últimos dois anos, o Brasil bateu recorde seguido de superávit na balança comercial. 2017 foi o melhor dos últimos 29 anos, desde que se começou a medir esses dados. Como o senhor enxerga esses números?

Welber Barral — O Brasil chegou a ter superávits muito altos no período de 2006 a 2010, que derivaram justamente do boom de exportação de commodities. Estávamos exportando bastante, principalmente para a China. Agora, estamos em um processo contrário. As commodities não estão com preço muito alto e os produtos industriais estão crescendo. As exportações nacionais não cresceram tanto, porém, a importação despencou por conta da crise interna no Brasil.Isso explica o saldo atual tão alto.

Os números apontam para um superávit mais balizado no preço do que no volume de vendas. Isso é uma ameaça para a perenidade desses resultados positivos?

As importações no Brasil têm uma característica interessante: 50% são de insumos, 30% de bens de capital. Bens de consumo representam menos de 20%. Então, quando o Brasil aumenta as importações com esse perfil, é uma notícia positiva. Significa que a indústria está funcionando mais, está havendo investimento em equipamento. Nesse sentido, a importação nacional contribui bastante para o crescimento econômico. O que deve acontecer é que, com a retomada do crescimento, haverá mais importações. No entanto, se o Brasil não reagir nas exportações no mesmo nível, o saldo deve diminuir.

Falando sobre o alumínio, o País também aumentou o superávit da balança comercial. O saldo de 2017 foi 40% superior ao de 2016, focado em bens primários (alumina e bauxita). Como isso se explica?

O setor de alumínio acompanhou uma tendência no Brasil nos últimos três anos: as empresas de setores em que há competitividade do produto brasileiro fizeram um esforço enorme em exportação quando houve queda interna de demanda. Toda vez que o mercado interno se retrai, as companhias exportam. Depois, há um crescimento interno e o foco na exportação é deixado de lado. Esse refluxo não é eficiente, pois você precisa de perenidade no processo de importação e exportação.

O presidente americano Donald Trump anunciou medidas de proteção comercial sobre o alumínio e aço. O Brasil está entre os países afetados — agora, sobre a importação do alumínio brasileiro, será cobrada uma taxa de 10%. Como isso afeta o setor?

O grande alvo de Trump é a China. O Brasil, apesar de ser um grande exportador de aço para os EUA, não é um país que tem um grande superávit em relação a eles. Apesar disso, uma medida protecionista é negativa para o setor do alumínio, pois pode criar desvio de comércio para o mercado brasileiro.

Qual a melhor saída possível para esse impasse, a fim de que gere menos prejuízo para as empresas do segmento?

As consequências das ações norte-americanas ainda não são claras e alguns países, como o Japão e os da União Europeia, já anunciaram medidas retaliatórias contra os EUA. Nenhum país ganha com guerra comercial, e a multiplicação de medidas protecionistas causa prejuízos a todos.

Como o senhor avalia a posição do governo brasileiro diante da situação?

O governo brasileiro evita reconhecer oficialmente as quotas propostas pelo governo norte-americano, como forma de não legitimá-las. Isso permitirá também ao Brasil questionar essas medidas na OMC, se for necessário.

Há algo que as empresas do setor devem fazer para atenuar a questão?

As empresas devem acompanhar a evolução do mercado e buscar também diversificar mercados e consumidores. A dependência de um ou poucos países pode ser fatal para empresas intensivas em capital, sobretudo em momentos de grande instabilidade.

A impressão é que existe uma onda global de protecionismo. Como tudo isso pode afetar as exportações e também as importações brasileiras?

Guerra comercial, repito, não é positiva para ninguém. O Brasil tem a característica de ser um país muito fechado. A participação de comércio exterior no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é relativamente pequena quando se compara com países como México, com economia muito mais internacionalizada. O processo de exportação pode ser fundamental para vários setores de economia brasileira. E esses setores serão afetados pelo protecionismo.

O que falta para que o Brasil explore ao máximo o seu potencial de país exportador?

O Custo Brasil. Poderíamos ser uma grande plataforma exportadora, gerando muitos empregos a partir do comércio exterior. Isso não é realidade por problemas que nós mesmos criamos. O sistema tributário é negativo para a exportação, cria ônus demasiado para a produção no Brasil. Além disso, o custo de investimento é alto, a mão de obra é cara, a tecnologia é relativamente escassa. Há um conjunto de fatores que diminui a nossa competitividade, mais que o protecionismo.

Além desses desafios, quais os outros problemas para quem exporta hoje no Brasil?


Quais medidas o governo tem tomado para deixar o País mais industrializado e competitivo?
Embora o País tenha uma competitividade natural por conta da matéria-prima, está se tornando uma nação que exporta commodity, mas não consegue exportar o produto elaborado. Não podemos exportar bauxita ou alumina e comprar alumínio. Em tese, deveríamos beneficiá-lo aqui. Existe ainda o custo de energia, questão fundamental no setor de alumínio, e o custo de logística. Além disso, nenhum outro país exporta imposto. A lógica do comércio internacional é desonerar a exportação para criar mais emprego e riqueza. Mas o sistema tributário brasileiro, por conta dos vários tributos incidentes na cadeia, acaba gerando resíduo tributário e o produto fica mais caro.

Existem dois níveis de discussão. Um é a macroeconomia. O Brasil aprendeu desde o Plano Real que aventuras financeiras não valem a pena e têm um custo muito alto posteriormente. A segunda questão: qual a política de comércio exterior? Essa não é umapauta central, infelizmente. Os candidatos à presidência da República pouco falam nisso. Há pouca noção da importância que isso tem para o Brasil. O comércio exterior poderia ser uma grande alavanca para o desenvolvimento do País. Mas precisa ser compreendido que várias das regras de prudência macroeconômica — ou seja, não entrar em aventuras financeiras, manter previsibilidade, diminuir taxa de risco — são também cruciais para o mercado exterior.

A ABAL lançou recentemente a Rota estratégica da cadeia brasileira do alumínio e um dos parceiros na elaboração do material foi o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). No documento, é proposto o desenvolvimento de políticas de incentivo à exportação de produtos e a ampliação de acordos e alianças de comércio exterior. Qual a importância de um planejamento desse tipo?

Esse trabalho da ABAL é fundamental. Talvez, por conta da memória inflacionária, não façamos planejamento no Brasil. O documento vai garantir ações que persistirão ao longo dos anos independentemente das pessoas e traça temas fundamentais para o setor, como a questão de acordos comerciais, que se multiplicam no mundo. Apesar de todo o cenário desafiador, o setor de alumínio brasileiro tem papel de destaque na economia e no mercado internacional.

Qual cenário o senhor enxerga para o segmento no âmbito do comércio exterior?

O setor de alumínio é intensivo em capital. O investimento em qualquer fase da cadeia é alto, demanda tempo e eficiência para se pagar. Isso tem de ser compreendido. Ninguém vai investir no setor se não tiver previsibilidade quanto ao comportamento futuro do mercado. No caso do Brasil, para ter mais investimentos, você precisa de um cenário mais claro quanto aos custos de produção — e é onde entra o tema central da energia.

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